quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Liberdades...

Não nos detenhamos mais sobre o conceito de "ir e vir", de caminhar, de sumir, de voltar à hora que desejar... De longe, essa não mais é pra mim a definição de "liberdade". Vai além. Ouvi nesses dias sobre saudade e fui remetido a uma insólita reflexão. "A saudade não está naquela casa, nas roupas, nas fotos... Ela está dentro de você".

Pude olhar pra mim mesmo e lembrar quantas vezes tentei fugir e ser livre desse sentimento que tantas vezes corrói. Busquei senão liberdade. E, mais uma vez, concluí que 'ser livre' não corresponde a 'poder fazer'. Aonde vou, carrego comigo meus sentimentos e, sim, minha liberdade. Ou minha prisão. É quando, como incontáveis vezes na vida, desejamos viajar, sumir e esquecer. O que queremos, outrossim, é ser livre dos sentimentos, das sensacões e tantas vezes das pessoas.

Olhei para trás e desejei ser livre novamente. Desejei gritar e, com um ato, atirar fora tudo aquilo que me encarcerava dentro do meu próprio coracão e, ainda, sob a severa pena dos meus devaneios. No entanto, sabia que somente o tempo poderia me tornar novamente livre.

Tornei, então, a ponderar: o tempo constitui o amor ou o amor constrói o tempo? Sempre decaio para a segunda hipótese. Afinal, a relatividade é definida pela intensidade. E o que torna intensa uma vivência não é o tempo decorrido, mas, sim, a profundidade do sentimento que a gerou. Logo, ainda que temporalmente, ou mesmo racionalmente, perceba-se a curteza, se os sentimentos que lhe deram causa forem alimentados em profundidade, terá sido longo e derradeiro. Essa eternidade pode até não ser física, mas, decerto, habitará inolvidavelmente nas lembranças.

E foram as lembranças que me sequestraram a consciência e a liberdade. E deixaram como dívida a saudade. E, agora, eu precisava do tempo como pagamento de resgate.

O tempo, contudo, fazia-me recordar da liberdade. Tornei-me saudosista e ao mesmo tempo imediatista. Não sabia em que espaço temporal queria/deveria colocar-me. Desejava ser livre. Cumpriria minha pena, pagaria com a dor. Mas não queria abandonar meu crime: a paixão que tem construído meu tempo. Eu a quero comigo. Sofro por vezes pelas injustiças da minha errante consciência. Mas a quero comigo.

A sensatez dos meus pensamentos, enganada pelas paixões e discursos do meu coração, buscou uma saída. Encontrei-a. Eu era livre. Sim, eu era livre. Essa foi a minha sentença. Poderia andar com um coração bandido, antes arrestado, mas agora sob liberdade. Um coração que ainda carrega o delito da paixão proibida, mas livre. Uma liberdade condicional, enfim. Eu era livre, mas queria guardar comigo essa paixão. Tentei viver como livre, mas enquanto guardei esse sentimento, fui punido pela saudade, pelas incessantes lembranças e pela inevitável prisão. Estou preso a ela. Mas ainda quero estar, porquanto é uma prisão que, de outro lado, torna livres e altos todos os sonhos. E continuo a sonhar, livre como o mais poético dos apaixonados.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Um ensaio sobre a (minha) vida

Resolvi reler alguns manuscritos. Estavam sobre a mesa, ainda inacabados. Não por descuido ou, sequer, desânimo. Na verdade, tem sido uma história recapitulada a cada dia. A cada amanhecer, algo novo e surpreendente me leva a ver em um papel, em seguida a alguns longos – ou tão efêmeros quanto a vida descrita na página anterior – minutos, um coração livre interpretado sob as limitadas tentativas das palavras que aqui pulsam.

Li. Apesar da agonia em escrever mais um capítulo (quando achava que já podia ter o ‘grand finalle’ no último que pretendi escrever), a fim de adorná-lo com as ainda não vistas pérolas que despretenciosamente encontrei escondidas e tanto me alegrei, reli o que já havia sido escrito. Com um unico propósito: definir quem sou. Se sou protagonista, coadjuvante ou figurante.

Resolvi, então, prencheer algumas linhas que completam minha realidade. Linhas quase apagadas, talvez pela pressa em manifestar um coração trovejante de sentimentos, mas, feliz ou infelizmente, legíveis. Li. Reli. Entendi que deveria decalcar o que não se podia ler de forma tão viva. E me descobri.

Não precisei de um raciocínio tão apurado para perceber que se tratava da minha história. Eu podia me identificar em cada palavra, ainda que as tivesse escrito inconscientemente. Ali estava meu coração. Ineteiramente aberto. Era eu. Eu era o protagonista. Alegrei-me pela vida gerada. Eram trechos e versos alegres. Naquelas linhas em que a caneta ameacou falhar, pareceu, na verdade, que eu mesmo as quis tornar sem vivacidade – e consequentemente imperceptíveis e imemoráveis.

Claro. Toda história, especialmente as mais românticas, tem - ou devem - carregar um pouco de melancolia. Elas servem de percurso essencial – ainda que se não a deseje ou a rejeite - para o corolário da paixão. Mas eu particularmente não queria lê-la novamente. Eu era o protagonista. Tratava-se do meu próprio coracão exposto pelo que vivi. E reler as dores significava senti-las mais uma vez. Preferi mantê-las em grafias desprezíveis. No entanto, ainda eram legíveis e, involuntariamente, eu as lia. Naquele exato momento, então, percebi que deveria avivar sua cor. Isso me fez entender quem eu realmente era.

Sem me dar conta da surpresa de que não era protagonista - porquanto esta foi prematuramente lançada de lado, já que meus olhos, apesar de tê-la percebido, desviaram-se para quem ensaiava o papel principal no meu coração - redescobri-me. Meus olhos nao viam a mim mesmo. A janela que se abria e permitia, com intenções ignoráveis, uma varredoura luz adentrar e clarear o que por dias estava apagado na escuridão, buscava a imagem de alguém.

Então, compreendi que tudo o que havia se materializado em palavras vinha, sim, do meu coração, mas eu nao era a fonte. Era ela. As águas que via, e até as que não enxergava, mas lutava por senti-las percorrer-me e lavar-me (já não sei se foram reais ou uma mera ilusão psicologica), fluiam das lembranças e sensações que provei, em níveis físicos ou, precipuamente, emocionais com aquela que certificadamente me tomou para si. Era com ela. Era dela. Percebi que o papel principal no meu coração não era meu, mas dela. Era dela o rosto que via; era dela o cheiro que me esforçava para sentir antes de dispersar-se com os ventos do que de novo eu vivia; era dela o toque que, de tão intenso, podia sentir quase palpável na minha pele. Era ela definitivamente a protagonista dos meus inesgotáveis versos. Eu passei a ser o coadjuvante.

Aquela era uma linda história. E eu a relia. Apressadas certezas findavam cada capítulo. E cada vez mais dava-me por certo dos sonhos que brotavam das entrelinhas. Eu entendia. Não importava que ninguem mais entendesse, a não ser o singelo e cativante coração de quem tanto me inspirava. Logaritmos emocionais – pensava eu – que a mente não decodificava, a não ser um coração com as devidas chaves. Era, portanto, o coração dela que eu buscava alcancar.

A arrazoar sobre a vida, sobre a história que se deslanchava naqueles rascunhos, prestei atenção ao cenário, as circunstâncias que se perfaziam em volta do foco do qual meus olhos até então não tinham desgrudado. Ponderei que precisava desenhar as cores de fundo sobre o qual aquele rosto estava detalhadamente esculpido. Busquei o que havia em minha volta e só enxergava o que havia em volta dela. Eu não importava. Já tinha esquecido-me do que estava tão perto, mas temporareamente invisível. Então, vi alguns figurantes.

Com um pouco mais de atenção e reflexão, notei que certos figurantes traziam cores muito vivas, além das que eu previamente imaginara. Depois de descrevê-los um pouco mais, questionei-me se eles eram meros figurantes. Não. Eram coadjuvantes. Certifiquei-me disso quando precisei fazer parte apenas do cenário, num canto, com tonalidades fracas, enquanto os outros ocupavam, juntamente com a minha musa, o enquadramento focal daquela pintura. Eu passei a ser, destarte, um figurante.

Li e reli toda aquela história, não mais ignorando nenhum traço tortuoso de alguma letra inteligível. Parei a cada ponto. Suspirei a cada vírgula. Refleti a cada parágrafo. Inquieto, buscava encontrar derradeiramente meu papel naquela história. Entendi que não podia ser protagonista e, sim, coadjuvante. Mas percebi-me como figurante, pois, mesmo longe da luz principal, ainda fazia parte daquele enredo. Eu era alguem ali.

Ao fim de tudo, no entanto, percebi que não só não disputava um lugar tão perto da protagonista do meu coração, como não mais fazia parte da sua historia, que era contracenada por ela e por quem eu achei que fosse apenas figurante. E os figurantes eram outros. Descobri-me, afinal. Eu não passava de um espectador, que, outrora inteiramente envolvido, agora apenas contava por aí de um lugar privilegiado a história de outrem.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Poemas em Linha Reta (Fernando Pessoa - Alvaro de Campos)

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?


Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Meus Sonhos: a minha realidade

Acordei. Abri a janela. Vi o Sol. Tudo isso aconteceu como havia tempos não acontecia. Senti-me vivo, alegre, entusiasmado... e, acima de tudo, com o sentimento de realização. Há quanto tempo, afinal, não acordava tão cedo pra... fazer nada! Tomei um bom café da manhã, como também havia esparças lembranças da última vez. Li. Nossa! Fui à estante de livros e, livre e desimpedido (essas são mesmo as palavras que mais se adequam às minhas sensações naquele momento), dei-me o requinte de escolher o que queria ler naquela manhã. Quis ler sobre História. Achava que deveria conhecer mais, intelectualizar-me mais... reviver!

Assim começou esta manhã, que, por mais que tenha sido real, confunde-se com metáforas. Posso descrever a vida, o Sol, a janela que me levou o olhar ao lado de fora - à vida - como a literalidade de um dia que representou o ponto fotográfico ideal de sobre a ponte que me leva ao lugar almejado. Mas, talvez com maior precisão do que o que os olhos definitivamente viram, isso descreve o que acontece dentro de mim.

Acordei. Abri a janela. Vi o Sol. Ponderei viver. Decidi ver o Sol que brilha do lado de fora. Revolvi fugir dos recôncavos que me escondiam das minhas prórprias dores. Por um considerável tempo, refugiei-me na escuridão da minha mente: ideias envelhecidas, experiências já deterioradas pelas traças das tribulações, sentimentos amedrontados... Desejei viver. Renovar ideias, ter algo novo pra contar e, especialmente, ter vida pra sentir. A imagem da dona dos meus olhos, sobre a qual pus os movimentos que a minha memória guardara nítidos de dias de realismo, serviu-me de porta-retrato e inspiração.

Um breve prelúdio sob as silenciosas horas noturnas encarregou-se de gerar o brilho que raiaria logo cedo. Pode-se falar de idealizações; aquelas que desfiamos antes de derradeiramente adormecer... mas, ao mesmo tempo - ou talvez intrinsecamente -, de uma correnteza que, suave, carrega-me sutilmente para o lugar dos sonhos. Ainda me é translúcido se os sonhos me geram vida ou se a vida me gera sonhos. A única certeza é a de que ao toque de cada minuto - o monótono som do ponteiro dos segundos, gritantes pelo silêncio do quarto, já se tornara parte do compasso de cada pensamento que viajava à velocidade da explosão do coração - aquela voz tão doce, cujas perfeitas palavras ecoava viva em minha recente memória, movia sonhos e idealizações.

Sinto-me bem. Sinto-me vivo. Sinto-me completo. Sinto-me realizado. Simplesmente por percorrer um caminho que traz de volta a vida. Ainda sinto falta do toque suave das mãos que me acariciam a alma. Ainda anseio o abraço que me envolve as razões. E pego-me paralisado diante de letras eufóricas e grafias ansiosas; descubro-me anestesiado por cada doce declaração, enquanto dentro de mim, um reboliço sem fim. Mas as janelas abertas me permitem ver o Sol a brilhar intensamente ao horizonte. E sonho. E planejo. E descubro. E desejo. Ao menos até que a viração do dia me leve de volta aos sonhos...

Então, fecho a janela sob a cantaria das estrelas e adormeço, para sonhar com a imagem que, pequenina em minha frente, rega novos pensamentos e sonhos. Durmo para sonhar, apesar de não requerer a inconsciência, porquanto na minha mais clara racionalidade, planejo. Teimo em manter-me acordado, pensando, relembrando e sentindo, mas, assim, adormeço... E sonho. Mas vou-me com a marca de que nesse dia, acordei, abri as janelas, vi o Sol e percebi que tudo é real.

domingo, 28 de novembro de 2010

Apenas saudades... do distante que não me é estranho

O silêncio nunca foi tão ensurdecedor. Parece que todas as lamentações passaram a fazer sentido, quando antes eram apenas lidas - ou ouvidas - e ignoradas. A impiedosa canção da verdade... Será da verdade? Já não sei se é ou se é apenas um delírio originário de um sentimento inquilino. Inquilino ou cônjuge? Já não sei se logo se vai ou se permanecerá até que a morte o leve. A única certeza é de que, dentro de mim mesmo, estou perturbado. Até quando? Já não arrazoo mais...

Sinto-me inútil, apesar da ebulição de pensamentos. Não consigo ordená-los - ou talvez nem me importe em fazê-lo. Só sinto vontade de escrever e derramar sobre o pano o vinho nunca provado... A cada frase, mil reflexões, porém apenas uma palavra escrita. Isso tem, no finalzinho do paladar, um gosto adocicado. Entendo agora que "é no território da melancolia que o poeta lavra a palavra, acende iluminuras". Ou que "a Literatura nasce do que não tenho e por isso a ausência é fator criativo".

Simplesmente escrevo. E vou escrevendo. Sinto-me saudosista. Mas saudade de quê, se nunca possuí?! Saudade de uma voz que não pode ser lembrada pelo sorriso que nunca vi? Saudade do abraço que não pode ser revivido pela ausência do tão desejado toque que nunca experimentei? Mas sinto falta... Sinto muita... Só sei disso. E sonho... Continuo a sonhar... Sem um rumo, é certo, mas caminho... Ainda quero caminhar. Ainda quero escrever. Ainda tenho por que escrever, porquanto "a ausência é o fator criativo". E depois? E se a ausência definitivamente der lugar à doce presença que tanto desejo?

Daí, então, terei mil poesias. Já não mais com tons monocromáticos... Não mais será uma canção de uma nota só... Não mais será uma fábula repetida que se ouve antes de adormecer - quando nos querem fazer dormir e esquecer. Terá cores, em essência como são: infinitas.

Mas não estou tão certo disto, posto que um breve sussurro ou um chamado ao longe me tira completamente a atenção de mim mesmo. Aquela voz, aquele convite, me faz voltar atrás de todas as decisões. E assim deixo a caneta sobre o papel, aguardando um desfecho... que talvez nunca existirá. Muito provavelmente a página será virada e outra poesia será escrita.

sábado, 27 de novembro de 2010

Quando o guardião perdeu suas armas

"Quero muito ficar contigo", foi o pensamento que ecoou por todos os sentidos e níveis mentais e emocionais daquele que um dia se encubiu de guardar o mais precioso tesouro. Deu-se conta de que perdeu toda a segurança quando este pensamento tornou-se palavras audíveis.

Sou pensante. Logo, existo - completaria algum filósofo esquecido pelo tempo. Por certo momento, embalsamado com suas filosofias, até que alguém, em algum momento, se lembra de alguma de suas antes célebres frases e resolve refletir a respeito; especialmente, quando se vê perdido na possível motivação daquele que a escreveu primeiramente. E compreende-o.

Arrazoo que pensamentos são como portões, porquanto é somente a partir desses conceitos que nos servem de parâmetro a qualquer passo que definitivamente nos permitimos galgar qualquer caminho, adentrando qualquer lugar. Isto é, se algum pensamento ou conteito não parecer razoável, a porta permanece fechada, e aquelas novas sensações e vivências não são permitidas a entrar no coração. Caso contrário, as portas se abrem e o acesso é irrestrito. Talvez isso explique como algumas mudanças em nós mesmos acontecem tão rapidamente.

Acontece que alguns pensamentos, pré-concebidos, nos servem de guardiões. São como princípios-mor, com patentes maiores dentro de nós mesmos. É engraçado vislumbrar assim, especialmente quando nos lembramos de quantas idéias buscamos para nos convencer a nós mesmos de algo, geralmente em vão, porque tais guardiões se mostram maiores e mais definidos, combatendo os eventuais sofismas que tentamos aludir. Na nossa própria mente, recrutamos soldados para combater a nossa maior [própria] defesa, os maiores guardiões - os mais sólidos princípios, convicções e razões.

E assim vivemos. À medida que envelhecemos e amadurecemos (a ultima parte não é necessariamente um corolário), fortalecemos esses guardiões. Com o passar do tempo, alguns morrem, pois percebemos que guardam o que não precisava ser guardado, ou defendiam o que não havia fundamento para o ser. É a eterna metamorfose pela qual, até nosso último dia, viveremos. Alguns princípios permanecem, claro. Exemplos disso são a cautela, a prudência, a paciência... São os grandes guardiões do coração.

A paixão. Ah, a paixão. É só mostrar-se que os os alarmes soam e os guardiões cerram-se em guarda. Em alguns momentos, diante de algumas circunstâncias, em maior rigor ainda. Aquela tenta adentrar a mais pura fonte, a que gera vida. E é por isso que essas razões tornam-se tão intensas. Aguçamos ao máximo nosso senso, nossos sentidos. Não deixamos a paixão entrar até que tenhamos certeza de suas intenções. E, com passar do tempo, conhecemos seus argumentos. Tornamo-nos um pouco mais resistentes; às vezes, irredutivelmente invioláveis.

É exatamente este meu pensamento. Vivi. Vivi muito. Reflito sobre o tempo e suas implicações sobre o que chamamos de experiência ou maturidade. Sobre as patentes alcançadas por esses tão respeitáveis guardiões.

E assim eu me encontrava. Em um quartel genaral, selado, bem protegido. As razões eram, sim, grandes guardiãs, empunhando uma palavra tão convicta e segura como nunca se vira. Alguns caminhos até o coração... Ou melhor, alguns caminhos que levavam a partes mais profundas do coração eram intransponíveis naquele momento. A vigilância era realmente forte. Nada poderia me convencer do contrário. Nenhum sentimento poderia passar daquele limite. Eu estava muito certo disso. Estava.

"Mas...", foi a expressão, tão pequena e aparentemente insignificante, que pôs em risco todas as tão-firmes razões. Foi o momento em que toda aquela segurança começou a enfraquecer: quando do admitir ressalvas.

Percebi que ia perdendo aos poucos algumas sentinelas. Dava conta quando já acolhia aquela paixão em alguns cômodos onde antes apenas se ecoavam passos de rotineira checagem. Realmente ecos, pois nada havia ali desde que mobílias de moradas passadas foram definitivamente retiradas e só se via um quarto vazio. Vazio, mas protegido - constantemente vigiado -, afinal este é um lugar especial, não tão acessível, não fosse somente uma ante-sala.

Algumas portas foram abertas. Essas idéias já não estavam tão firmes e permitiram que a paixão, uma visitante antes terminantemente proibida de entrar, entrasse. E ficasse. E onde estavam aquelas sentinelas que deveriam guardar aquelas portas? Já acomodados, encantados com uma silhueta tão doce, e pura, e frágil, e tão singela... e tão encantadora... Ia perdendo as minhas defesas aos poucos. Mas os verdadeiros guardiões, os mais fortes princípios, sob o comando da prudência, aquela cuja tão-venerada aliança foi feita com a cautela, outro pilar de guarda, ainda se mantinham de pé. Logo, ainda havia segurança, pois o lugar mais secreto ainda estava fora de alcance.

No dia em que o alarme tocou, ninguém ouviu. Todas as defesas deveriam estar a postos - e rapidamente! Dos guardiões, as ordens, a tática, a esquiva, o recuo, o avanço, o ataque. Nada se teve. Nada se ouviu, a não ser uma suave melodia carregada por uma brisa tão suave que anestesiava até quem ainda não conscientizava qualquer juízo. Pensou-se em traição, em um golpe que poderia ter começado no mais alto grau hierárquico; cogitou-se uma invasão invisível, minunciosamente articulada; ou mesmo uma tentativa de furtar o que de mais valioso era guardado.

Era exatamente o que acontecia. Não se havia mais razões. Não se havia mais armas. Não mesmo, porque qualquer palavra já não se recordava das antigas ordens, das antigas convicções. Não por desobediência aos grandes conselheiros - os guardiões-mor: a cautela, a prudência, a paciência, além da sensatez. Todos eles também já haviam aberto as portas que durante longo tempo guardaram com vigor. E quem ainda não entendia, ouvia os rumores do que acontecia. Ouviu-se falar de conselheiros que geralmente, e há tempos, não se viam.

As armas foram capturadas, mas não de uma maneira violenta como se imaginou; os escudos, removidos, mas não sorrateiramente como se previu. Foram graciosamente retirados. Às sombras de todos, sem que nenhuma outra idéia pudesse conceber, manipular ou assistir e certificar. Foi por um conselheiro, a quem todos os guardiões obedecem, diante de uma voz que não se ouve como um trovão, de acordo com o que se ouvia falar, precipuamente pelos mais novos soldados, pelas recém-concebidas idéias. Era uma voz suave, paciente, pacificadora e, principalmente, sábia. Representa o controle, o equilíbrio e a certeza. Não se tinha ouvido dele até este momento em que a maior das decisões precisou ser tomada: abrir o coração. E, sim, ele, o amor, convencido de tudo, decidiu deixar entrar a paixão, desta vez vista com pureza, desarmada, com propósitos imperecíveis.

Estão a expor suas razões a esta altura... e o que se ouve falar é que parece que pensam em se aliançar.

A pensar nisso tudo, depois de conseguir restabelecer as bases, que não foram destruídas ou danificadas, mas reafirmadas, eu concluí: penso, existo e tenho vivido.

"Quero muito ficar contigo". Agora entendi por que e de onde veio essa sentença. E, agora, estou certo disso. Convicto. E a nova ordem dada aos guardiões é sobre a paixão, sobre o amor... sobre a aliança entre a paixão e a decisão do amor. Deve ser guardada, protegida, para que não seja violada, roubada ou manchada.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

De alguém sobre alguém...

... E soou antecipadamente a sirene do meu despertar. Não era agora. Não mesmo! Fui arrancado do meu lugar de sossego pela agitação da minha consciência. Não foi o toque do telefone, que já me impacienta, ou uma batida na porta, tão inoportuna, tampouco o alarme dos compromissos. Foi uma frase...

"A linha de chegada costuma ser repleta de dualidade".

Estava adormecido, "despretencioso", com os olhos fitos, não tão atentos, em qualquer notícia, ou novidade, ou contato, enquanto a mente já buscava, na profundidade dos mais complexos pensamentos, um lugar de repouso. Ao se perscrutar os horizontes das minhas emoções, já não se via uma linha tortuosa, cheia de ondas, mas um traço milimetricamente horizontal. O Sol, para garantir mais precisão, já se via nítido, e não mais com um brilho translúcido ofuscado pelas altas ondas que tempos atrás (horas, dias, meses) se projetavam.

O mar estava calmo e eu queria garantir esse momento. "Inocente e despreocupado", buscava a melodia, mesmo escrita (falo daquele pensamento gerado por um olhar ou uma só palavra o qual alimentamos sem limites até adormecer), que desejava para acalentar meu sossego.

Contudo, aquela frase me despertou e me remontou a flashes de todos os momentos que vivi, confundindo certas convicções - na verdade, sofismas que tomei como verdades máximas para não mais aflingir-me com aquelas reflexões -, e alterando velhas conclusões.

Essa frase parece ter sido a chave-mestra, antes escondida e agora descoberta, que abriria o que já estava impregnado de poeira. A não ser aquela parte sobre a qual deixei estendido o pano que me serviria para limpar esse baú. Essa parte refletia algum brilho, enquanto o pano, em seu lugar, estava empueirado. Era a intenção resolver todos aqueles pensamentos; deveria voltar lá para isso, limpar aquele baú... Isso explica o pano esquecido por tanto tempo sobre ele... Acabei deixando pra lá; não voltei.

E essa frase, à primeira vista tão simples, foi que me tirou do meu lugar de repouso (ou de comodismo emocional) e me levou de volta aonde eu deveria ajustar algumas verdades.

Quantas vezes acreditei em finais que eram, na verdade, apenas começos. Quantas vezes alegrei-me por definitivamente ter encontrado uma verdade de equilíbrio, firme e derradeira, quando, sem defesas, me via soterrado pelas velhas dores e medos. Tantas vezes... Tantas vezes achei que havia encontrado o melhor caminho, quando me via de volta, por passos cíclicos, ao mesmo lugar de onde desesperadamente queria fugir.

Quantas vezes cheguei e, achando que tinha chegado, precisava novamente escolher, desenganado, uma dentre tantas outras portas que se mostravam. A vida não é tão objetiva como queremos e tentamos vivê-la (quando tentamos).

Ou naquelas situações em que se arrazoa uma direção (arrazoar, que é "chegar a uma razão", pressupõe mais de uma razão, logo mais de uma pessoa), ou mesmo um desfecho, e, no fim, nada se consegue. As velhas paixões ainda persistem, enquanto as razões se negam a unirem-se.

Ou mesmo quando, indignados com nós mesmos, decidimos por um extremo e depois de poucos minutos cedemos aos velhos caminhos. Tornamo-nos a envergonhar-se, a indignar-se, mas por uma só palavra, como é tantas vezes, esquecemo-nos de todo o forte que sobre areia construímos. E voltamos às dúvidas, medos e dualidades.

Por vezes, achamos que amadurecemos, que fomos curados, que estamos fortes... que, enfim, alcançamos a linha de chegada. Então, percebemos que precisamos tomar as mesmas decisões novamente, caminhar pelos mesmos caminhos já tão conhecidos, cruzar com as mesmas pessoas, sentir as mesmas sensações...

Tudo vai parecer novo, e tais portas, apesar de um dia já visitadas, vão se mostrar como dualidades, exigindo de nós "novas" escolhas ou uma "nova" adaptação ou interpretação. Mas na linha de chegada - ou em uma nova margem de partida - tudo vai se mostrar como antes. O que torna tudo novo, no entanto, são as velhas emoções renovadas.

E cá me percebo a refletir sobre meus passos, meus sentimentos, minhas reações, minhas decisões e a, mais uma vez, tentar explicar, ainda que pra mim mesmo, como tudo acontece. Cheguei ao fim, mas não sei se terminei. Afinal, "a linha de chegada costuma ser repleta de dualidade".

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Quando nada mais importa...

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Foi, então, que me dei conta da explosão de pensamentos que invadiram minha
perdida consciência... Mas nada consegui escrever, pois me ative a senti-los.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Reconstruindo a vida

Um lapso de vida permaneceu oculto. Depois de tempos indeciso sobre ir para um deserto ou permanecer sob a zuada, que já me incomodava... Tomo por oportuno esclarecer que tal zuada não se trata meramente dos sons naturais de um convívio interpessoal - os quais, admito, por vezes incomoda -, mas da minha própria consciência, em conflito com a voz das minhas paixões, ainda em dissonância com aquelas que vinham de fora. Enfim... Decidi caminhar. Apenas caminhar. Em silêncio.

Um lapso de histórias apenas sentidas permanecerá oculto. Este se tornou um lugar vazio, sem mobílias, com apenas um vaso. Este serve unicamente como sinal de que um dia já houve vida aqui. Bom para quem, à época, assentou-se e tomou um bom café enquanto ouvia as belas histórias contadas com tanta paixão, com tanta intensidade, como nunca foram vividas e que jamais seriam esquecidas. Mero engano. Não fosse um baú secreto que guarda essas memórias, elas seriam desbotadas pelo tempo, o qual, cada vez mais se distancia. De fato, no centro das emoções de quem pôde viver cada momento aqui há uma ligeira lembrança. Aconteceu. Sabe-se disso. Mas a magia, o sentimento envolvido, a empolgação, os desejos e sonhos... Nada mais... Tudo se tornou apenas lembrança.

Um lapso de vivências não foi desenhado e posto como um quadro nessa casa. Vejo, lembro, sinto (sim, sinto) e percebo que muita coisa mudou. Muita coisa mudou. Revejo este único vaso como a última mobília disposta naquela época, o qual, na verdade, já representava uma mudança de épocas. Um adeus a tudo aquilo que já havia sido encaixotado. Pensei em retirá-lo também, mas ponderei que ele serviria de memorial, a me fazer lembrar, diante dessa nova decoração, desse novo tempo, da nova vida que aqui há de habitar, como tudo começou, como tudo aconteceu e... aonde estou.

Um lapso de emoções não foi contado por um bom tempo durante o café da tarde, ou da noite (a depender de que horas os visitantes viriam para ouvi-las). Muita coisa aconteceu. Risos, choros, decisões firmes, recaídas, sonhos, frustrações... Nada foi contado. E agora ficou para trás. Uma nova decoração ornará este lugar. Não sei se ainda será o lugar ideal para tomar um bom café enquanto se ouve uma linda história de amor. Não sei mesmo se ainda será um local apropriado para se deleitar nos melhores (desde que escritos com profundidade e paixão) textos. Mas, decerto, será um lugar para se refletir, aprender, compartilhar.

Um lapso de minutos se passou até que, mesmo insatisfeito com essa nova mobília - ainda acho que não está tão bonita ou disposta no canto ideal -, o primeiro móvel dessa nova decoração estivesse em seu lugar. Olho, reflito, dou de ombros e saio. Fecho a porta. As janelas, contudo, ainda estão abertas.


terça-feira, 14 de setembro de 2010

Em uma dimensão interior

Por todo o tempo de nossas vidas mudamos conceitos. Quando somos ainda crianças, aprendemos e nos empolgamos; queremos compartilhar com todos, pois nos consideramos os mais inteligentes, até descobrir que a nossa idéia nem era a mais extraordinária, tampouco a mais completa.

Algum tempo depois, ao chegarmos à adolescência, a fase engraçada em que achamos ser independentes, mas não podemos nem sequer trancar a porta do quarto, já guardamos alguns conceitos. E temo-nos como as mais maduras verdades. É apenas um extremo. Pouco tempo depois, deixaríamos de lutar por ela, pois vemos que contradizemo-nos a ela. Claro. São apenas teorias bonitas, mas sem o imprescindível toque da sensatez.

E novamente mudamos. Desistimos de lutar por tudo aquilo que, por algum tempo, nos desgastou. Nada tão profundo, na verdade. Fase essencial, pois, com esse quê de uma rasa frustração, percebemos (apenas depois, claro) que não estávamos edificando um pilar tão sustentável. E somos levados para o outro extremo, do qual, por fim, partimos para o esperado, contudo até então desconhecido, ponto de equilíbrio. E sorrimos da fase passada. E lá ficamos. E lá solidificamos alguns conceitos.

Descartes, um filósofo iluminista, falava sobre 'axiomas básicos', verdades incontestáveis a partir das quais poderíamos constituir verdades mais profundas. Acredito que é nessa fase, apesar de tanto tempo decorrido e tantas experiências vividas, que alicerçamos tais verdades básicas, tais firmes princípios. Então, buscamos novas ideias, novos conceitos, mais seguros, já que temos um sólido ponto de partida. E nos tornamos mais maduros, porquanto percebemos que aquelas verdades já conseguem ser seguidas pelas emoções.

Caminhamos com uma nova e inarredável bagagem de vida. Acompanhados dela, decidimos prudentemente, caminhamos com sensatez, vivemos com mais cuidado, apesar do constante tempero de ousadia. É quando nos vem o conceito - a mim nunca foi muito preciso - de 'risco calculado'.

Esses cálculos, entretanto, fazem-nos, hora ou outra, perder todos os conceitos. É quando soltamos a corda que nos garantia em um ponto de segurança diante do risco, do incerto. O novo, porém desconhecido (como sempre há de ser), rouba-nos do nosso lugar de auto-confiança. Vamos para um lugar onde nunca havíamos pisado; uma dimensão definitiva e completamente nova. Sem luz, sem certezas, sem chão. Na verdade, ponderamos que ainda não precisávamos de chão, pois percebíamo-nos como que a voar, flutuando dispersos naquelas fortes emoções. Um lugar torna-se farol. Apenas deste lugar enxergamos alguma luz (talvez uma metáfora para expectativas, ideais, sonhos que nos guiam). Torna-se engraçado quando se é expectador.

E então empregamo-nos a fio para tentar nos encontrar em nós mesmos. Perdidos; apaixonados, enfim. Vivemos algo novo. Novo. É isso! Lutamos por entender por que tudo é tão novo e por que isso nos deixa sem razões, mas cheio de sentimentos e sonhos.

Tentamos, destarte, responder alguns porquês e, com aquele suspiro de lucidez e enganosa maturidade, construimos um conceito de novo, já que é exatamente essa palavra que carrega a essência do que nos rapta quão rapidamente... e por inteiro...

'Novo' significa semanticamente "que se vê ou se ouve pela primeira vez", de acordo com a definição do douto Priberam. Isso traz muito sentido. Afinal, gostamos do novo. Acontece, outrossim, que, em alguns casos - talvez poucos, algumas vezes únicos - ultrapassamos o nível da satisfação e alcançamos o de 'marcante'. E por lá, nesse lugar criado pelo coração, decidimos tomar um café (ou um chocolate gelado que leva o nome da cafeteria que o criou) e conversar por horas. Simplesmente para não sair de lá. Um dia, no entanto, temos que sair.

Não sei se para um dia voltarmos, a fim de se passar mais alguns eclípticos (e leia-se com essa essência: incomum e incrivelmente belo) momentos, ou se para n'algum outro lugar permanecermos derradeiramente. Ou mesmo para nunca mais voltarmos; e, então, apenas guardarmos na protegida especial caixinha cuja identificação entitula "Preciosas lembranças".

Cheguei a uma conclusão, depois mesmo de tentar encaixar-me em um outro conceito da supracitada palavra, a qual até então persegui. 'Novo' também pode significar aquilo "que se ignorava". Não posso dizer que ignorava (e aqui peco por não avaliar a universalidade, de maneira imparcial, pois apenas uma situação da vida me serve de padrão neste julgamento), porquanto não havia como previamente conhecer. Quando conheci, não resisti. Se não resisti, não ignorei. Logo, se não ignorei, esse conceito não me serve.

A questionar sobre tudo, adequei-me a um conceito objetivo e a outro subjetivo. Objetivamente (falo de coisas palpáveis, materialmente visíveis), vivi coisas novas, realmente inéditas. Fui a lugares aonde nunca houvera ido; degustei o que antes não havia me arrebatado; vi o que outrora nunca havia me tomado, caminhei por onde nunca havia me apaixonado; ouvi e falei como antes nunca pensei em conquistar e ser conquistado. Novo. Isso foi novo. Marcante, cativante, inesquecível e certamente irrepetível. E desses adjetivos vem o conceito subjetivo (o que só eu posso sentir).

Entendi, por fim, por que tudo o que senti era inteiramente novo e, precipuamente, porque me arrancou de mim mesmo daquela maneira, sem que eu mesmo soubesse como agir. Pude, ainda, arrazoar comigo mesmo, agora de maneira clara, sobre o desespero que me tomou em alguns momentos: era simplesmente por não querer deixar ir embora tudo aquilo que gerou em mim um novo conceito, nunca antes visto, ouvido ou ignorado.