quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Reconstruindo a vida

Um lapso de vida permaneceu oculto. Depois de tempos indeciso sobre ir para um deserto ou permanecer sob a zuada, que já me incomodava... Tomo por oportuno esclarecer que tal zuada não se trata meramente dos sons naturais de um convívio interpessoal - os quais, admito, por vezes incomoda -, mas da minha própria consciência, em conflito com a voz das minhas paixões, ainda em dissonância com aquelas que vinham de fora. Enfim... Decidi caminhar. Apenas caminhar. Em silêncio.

Um lapso de histórias apenas sentidas permanecerá oculto. Este se tornou um lugar vazio, sem mobílias, com apenas um vaso. Este serve unicamente como sinal de que um dia já houve vida aqui. Bom para quem, à época, assentou-se e tomou um bom café enquanto ouvia as belas histórias contadas com tanta paixão, com tanta intensidade, como nunca foram vividas e que jamais seriam esquecidas. Mero engano. Não fosse um baú secreto que guarda essas memórias, elas seriam desbotadas pelo tempo, o qual, cada vez mais se distancia. De fato, no centro das emoções de quem pôde viver cada momento aqui há uma ligeira lembrança. Aconteceu. Sabe-se disso. Mas a magia, o sentimento envolvido, a empolgação, os desejos e sonhos... Nada mais... Tudo se tornou apenas lembrança.

Um lapso de vivências não foi desenhado e posto como um quadro nessa casa. Vejo, lembro, sinto (sim, sinto) e percebo que muita coisa mudou. Muita coisa mudou. Revejo este único vaso como a última mobília disposta naquela época, o qual, na verdade, já representava uma mudança de épocas. Um adeus a tudo aquilo que já havia sido encaixotado. Pensei em retirá-lo também, mas ponderei que ele serviria de memorial, a me fazer lembrar, diante dessa nova decoração, desse novo tempo, da nova vida que aqui há de habitar, como tudo começou, como tudo aconteceu e... aonde estou.

Um lapso de emoções não foi contado por um bom tempo durante o café da tarde, ou da noite (a depender de que horas os visitantes viriam para ouvi-las). Muita coisa aconteceu. Risos, choros, decisões firmes, recaídas, sonhos, frustrações... Nada foi contado. E agora ficou para trás. Uma nova decoração ornará este lugar. Não sei se ainda será o lugar ideal para tomar um bom café enquanto se ouve uma linda história de amor. Não sei mesmo se ainda será um local apropriado para se deleitar nos melhores (desde que escritos com profundidade e paixão) textos. Mas, decerto, será um lugar para se refletir, aprender, compartilhar.

Um lapso de minutos se passou até que, mesmo insatisfeito com essa nova mobília - ainda acho que não está tão bonita ou disposta no canto ideal -, o primeiro móvel dessa nova decoração estivesse em seu lugar. Olho, reflito, dou de ombros e saio. Fecho a porta. As janelas, contudo, ainda estão abertas.