terça-feira, 14 de setembro de 2010

Em uma dimensão interior

Por todo o tempo de nossas vidas mudamos conceitos. Quando somos ainda crianças, aprendemos e nos empolgamos; queremos compartilhar com todos, pois nos consideramos os mais inteligentes, até descobrir que a nossa idéia nem era a mais extraordinária, tampouco a mais completa.

Algum tempo depois, ao chegarmos à adolescência, a fase engraçada em que achamos ser independentes, mas não podemos nem sequer trancar a porta do quarto, já guardamos alguns conceitos. E temo-nos como as mais maduras verdades. É apenas um extremo. Pouco tempo depois, deixaríamos de lutar por ela, pois vemos que contradizemo-nos a ela. Claro. São apenas teorias bonitas, mas sem o imprescindível toque da sensatez.

E novamente mudamos. Desistimos de lutar por tudo aquilo que, por algum tempo, nos desgastou. Nada tão profundo, na verdade. Fase essencial, pois, com esse quê de uma rasa frustração, percebemos (apenas depois, claro) que não estávamos edificando um pilar tão sustentável. E somos levados para o outro extremo, do qual, por fim, partimos para o esperado, contudo até então desconhecido, ponto de equilíbrio. E sorrimos da fase passada. E lá ficamos. E lá solidificamos alguns conceitos.

Descartes, um filósofo iluminista, falava sobre 'axiomas básicos', verdades incontestáveis a partir das quais poderíamos constituir verdades mais profundas. Acredito que é nessa fase, apesar de tanto tempo decorrido e tantas experiências vividas, que alicerçamos tais verdades básicas, tais firmes princípios. Então, buscamos novas ideias, novos conceitos, mais seguros, já que temos um sólido ponto de partida. E nos tornamos mais maduros, porquanto percebemos que aquelas verdades já conseguem ser seguidas pelas emoções.

Caminhamos com uma nova e inarredável bagagem de vida. Acompanhados dela, decidimos prudentemente, caminhamos com sensatez, vivemos com mais cuidado, apesar do constante tempero de ousadia. É quando nos vem o conceito - a mim nunca foi muito preciso - de 'risco calculado'.

Esses cálculos, entretanto, fazem-nos, hora ou outra, perder todos os conceitos. É quando soltamos a corda que nos garantia em um ponto de segurança diante do risco, do incerto. O novo, porém desconhecido (como sempre há de ser), rouba-nos do nosso lugar de auto-confiança. Vamos para um lugar onde nunca havíamos pisado; uma dimensão definitiva e completamente nova. Sem luz, sem certezas, sem chão. Na verdade, ponderamos que ainda não precisávamos de chão, pois percebíamo-nos como que a voar, flutuando dispersos naquelas fortes emoções. Um lugar torna-se farol. Apenas deste lugar enxergamos alguma luz (talvez uma metáfora para expectativas, ideais, sonhos que nos guiam). Torna-se engraçado quando se é expectador.

E então empregamo-nos a fio para tentar nos encontrar em nós mesmos. Perdidos; apaixonados, enfim. Vivemos algo novo. Novo. É isso! Lutamos por entender por que tudo é tão novo e por que isso nos deixa sem razões, mas cheio de sentimentos e sonhos.

Tentamos, destarte, responder alguns porquês e, com aquele suspiro de lucidez e enganosa maturidade, construimos um conceito de novo, já que é exatamente essa palavra que carrega a essência do que nos rapta quão rapidamente... e por inteiro...

'Novo' significa semanticamente "que se vê ou se ouve pela primeira vez", de acordo com a definição do douto Priberam. Isso traz muito sentido. Afinal, gostamos do novo. Acontece, outrossim, que, em alguns casos - talvez poucos, algumas vezes únicos - ultrapassamos o nível da satisfação e alcançamos o de 'marcante'. E por lá, nesse lugar criado pelo coração, decidimos tomar um café (ou um chocolate gelado que leva o nome da cafeteria que o criou) e conversar por horas. Simplesmente para não sair de lá. Um dia, no entanto, temos que sair.

Não sei se para um dia voltarmos, a fim de se passar mais alguns eclípticos (e leia-se com essa essência: incomum e incrivelmente belo) momentos, ou se para n'algum outro lugar permanecermos derradeiramente. Ou mesmo para nunca mais voltarmos; e, então, apenas guardarmos na protegida especial caixinha cuja identificação entitula "Preciosas lembranças".

Cheguei a uma conclusão, depois mesmo de tentar encaixar-me em um outro conceito da supracitada palavra, a qual até então persegui. 'Novo' também pode significar aquilo "que se ignorava". Não posso dizer que ignorava (e aqui peco por não avaliar a universalidade, de maneira imparcial, pois apenas uma situação da vida me serve de padrão neste julgamento), porquanto não havia como previamente conhecer. Quando conheci, não resisti. Se não resisti, não ignorei. Logo, se não ignorei, esse conceito não me serve.

A questionar sobre tudo, adequei-me a um conceito objetivo e a outro subjetivo. Objetivamente (falo de coisas palpáveis, materialmente visíveis), vivi coisas novas, realmente inéditas. Fui a lugares aonde nunca houvera ido; degustei o que antes não havia me arrebatado; vi o que outrora nunca havia me tomado, caminhei por onde nunca havia me apaixonado; ouvi e falei como antes nunca pensei em conquistar e ser conquistado. Novo. Isso foi novo. Marcante, cativante, inesquecível e certamente irrepetível. E desses adjetivos vem o conceito subjetivo (o que só eu posso sentir).

Entendi, por fim, por que tudo o que senti era inteiramente novo e, precipuamente, porque me arrancou de mim mesmo daquela maneira, sem que eu mesmo soubesse como agir. Pude, ainda, arrazoar comigo mesmo, agora de maneira clara, sobre o desespero que me tomou em alguns momentos: era simplesmente por não querer deixar ir embora tudo aquilo que gerou em mim um novo conceito, nunca antes visto, ouvido ou ignorado.